Com apoio do Confea, a Associação Brasileira de Engenheiras e Arquitetas do Rio de Janeiro (Abea-RJ) realizou live para discutir a Resolução 4.754/2019, do Banco Central, que dispensa perícia de Engenharia para aprovação e financiamento de imóveis. O debate virtual na última quarta-feira (31/3) foi mediado pela presidente da Abea-RJ, eng. civ. Iara Nagle, e teve a participação do presidente do Confea, eng. civ. Joel Krüger; da presidente da Associação Brasileira de Avaliação e Perícia (Abap), eng. civ. Karine Moreira; do vice-presidente do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia (Ibape), eng. civ. Luciano Ventura; dos presidente e diretor-geral da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), eng. civ. Mário Willian Esper e eng. mec. Ricardo Fragoso, respectivamente; do ex-vice-presidente da Associação Nacional dos Engenheiros e Arquitetos da Caixa Econômica Federal (Aneac), eng. Erieldon Leão; e do deputado federal e eng. prod. Paulo Ganime (Novo-RJ).
Aos debatedores e mais de 400 participantes, o presidente do Confea falou que o equívoco do normativo é retirar a Engenharia do processo de vistoria de imóveis para apuração de valor e habitabilidade. “As profissões de engenheiro são caracterizadas pelas realizações de interesse social e humano, nosso trabalho é defender os interesse coletivos; por exemplo de quem está comprando um imóvel que não pode ter patologias e que deve estar em um terreno regular de acordo com a legislação,” explicou o eng. civ. Joel Krüger, ao lembrar que os argumentos já foram apresentados ao Bacen e ao Ministério Público Federal (MPF). “Agora buscamos apoio no Congresso Nacional para reverter essa resolução que coloca em perigo a sociedade”, acrescentou.
Na avaliação do presidente, o novo regramento gera mais danos do que benefícios porque efetivamente não reduz custos nem agiliza os trâmites, mas promete modernização a partir de uma simplificação técnica arriscada. “A securitização pode resolver uma equação financeira, mas não resolve o humano e o social. Não tem seguro que resolva o prejuízo social”, advertiu, ao mencionar que a resolução configura uma tentativa de implantar no Brasil um padrão americano que desconsidera o valor de mercado de imóveis que constituem garantias reais, cobrindo os riscos disso com a contratação de seguros. “Queremos sim a modernidade, mas não abrimos mão da participação técnica dos nossos profissionais para garantir a segurança da sociedade”.
Krüger ressaltou ainda que a avaliação de imóvel realizada por engenheiro perito é baseada em laudos técnicos que respeitam as normas da ABNT e o Acordo de Basileia, cuja finalidade é dar mais segurança e preservar a solidez do sistema bancário mundial. Com a nova resolução, essa sistemática dá lugar à inteligência artificial, que não considera as especificidades de cada caso. “Diferentemente da Resolução do Bacen, as normas da ABNT são de nível internacional e elaboradas pela própria sociedade, dentro de um processo de autorregulação democrático”, pontuou o presidente da associação, eng. civ. Mário Esper, ao se colocar à disposição para demonstrar a importância das normas técnicas aos órgãos responsáveis pela implantação da Resolução 4.754/2019.
O deputado Paulo Ganime, por sua vez, disse enxergar um rol de oportunidades com a nova resolução. “Percebo um mercado que se acelera por diversas características ligadas à evolução e à modernidade que a gente vivencia por conta das novas tecnologias. Vejo iniciativas que estão mudando o mercado de avaliação de imóveis com mais tecnologia, dados e informações. É claro que quando a gente utiliza essa tecnologia para analisar de forma minuciosa um imóvel ela não supre a mesma qualidade ou a mesma necessidade de avaliação que um avaliador faria”, comentou, frisando ter interesse em compreender as questões listadas pelos demais debatedores à avaliação de imóveis. “Só evoluímos quando todos são ouvidos e temos uma solução ideal para o país”, afirmou, ao assumir o compromisso de fortalecer o diálogo técnico em outras esferas, como no Banco Central e na Comissão de Finanças e Tributação, da qual ele é membro. “Se entendermos que faz sentido a realização de uma audiência, podemos fazer um debate rico.” Em agradecimento, a mediadora e presidente da Abea-RJ salientou a relevância da aproximação com o parlamentar. “Seu apoio será extremamente importante como ponte para facilitar acesso ao Ministério da Economia e vamos, sim, querer uma audiência pública para debater o assunto”, reforçou Iara Nagle.
O pedido de colaboração também partiu do vice-presidente do Ibape. “Muito boa essa preocupação do deputado com o big data e machine learning. É importante dizer que estamos dispostos a discutir e aprimorar nossa profissão nesse sentido, mas precisamos mostrar ao Bacen que o engenheiro é essencial no processo avaliatório”, acentuou Luciano Ventura, citando a NBR 14.653-1/2019. A norma orienta que “a vistoria deve ser efetuada pelo profissional da engenharia de avaliações com o objetivo de conhecer e caracterizar o bem avaliando, daí resultando informações essenciais para a respectiva avaliação”. Por isso, a “eventual dispensa de visita de inspeção ao imóvel” é o ponto crítico da resolução do Banco Central, de acordo com o representante do instituto de perícias.
Sobre a robotização, o ex-vice-presidente da Aneac chamou atenção do parlamentar para pontos que demandam reflexão. “Os robôs buscam na rede os dados de mercado para emitir um valor para o imóvel. Isso pode gerar uma bolha porque eles só pegam a oferta e transformam ela em valor, que passa a retroalimentar o sistema. Os algoritmos são uma caixa-preta nesse sentido. Como tratar os dados falsos e distorcidos da rede? Como será a definição das diversas áreas do imóvel? Na avaliação, é primordial considerar a depreciação física do imóvel, as fissuras e vícios construtivos. O robô não vai saber disso. E a fundamentação do valor baseada em técnica, como será feita?”, questionou Erieldon Leão, que teve respaldo da presidente da Abap. “O valor que nós engenheiros colocamos na avaliação é real porque o laudo obedece normas técnicas e recomendação internacional. A bolha imobiliária explodiu nos Estados Unidos em 2008, mas aqui não aconteceu porque utilizávamos as normas.”
Segundo Karine, tirar o olhar de um engenheiro do processo de avaliação é prejudicar o consumidor, o sistema financeiro, a economia, a sociedade, além de gerar um desmonte no setor de Engenharia. “Irá atingir entre 10 e 15 mil empresas e poderá deixar 50 mil engenheiros e arquitetos desempregados em tempos de pandemia”, alertou a dirigente da Abap que tem mobilizado engenheiros e acionado órgãos públicos para reverter a Resolução Bacen 4.754/2019. Em dezembro passado, a associação e outras seis entidades do setor protocolaram manifesto contra o normativo no MPF.
Fonte: Confea