Coluna do Dal

Metais bélicos

De 1100 a 1867, os samurais foram soldados da aristocracia japonesa. Eram disciplinados, leais e craques no manejo da katana. A katana é uma espécie de sabre ligeiramente curvo e com gume só de um lado.

Adoniran Barbosa diria que era uma “faca de um legume”. Já o vereador Moko Yabiku, por certo, não concordaria com Adoniran, “pois uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa”.

No século XIV, um mestre japonês fabricante de katanas era requisitadíssimo pelos samurais da época. As lâminas das katanas que ele produzia nunca dentavam nem perdiam o fio. Todavia, o mestre construtor morreu sem contar o segredo de como as produzia.

Durante a Primeira Guerra Mundial, os alemães sacaram que o tal mestre japonês borrifava molibdênio no aço que usava para produzir as espadas. O molibdênio (do grego “molybdaina”, significando chumbo) fora descoberto em 1782 pelo sueco Peter Jacob Hjelm (1746-1813).

Antes do uso do molibdênio, os alemães fabricavam enormes canhões de aço, apelidados de “Big-Berthas” (Big-Bertha é um termo, em inglês, usado para designar coisas descomunais) que pesavam 43 toneladas, exigindo o transporte de muitos componentes e mobilizando cerca de duzentos homens para a montagem de cada “Bertha”.

Era um trambolho que consumia vários barris de pólvora para lançar um projétil de uma tonelada a quinze quilômetros. O calor era tanto que, depois do lançamento de alguns projéteis, as Berthas ficavam retorcidas e viravam sucatas.

Utilizando ligas de aço com molibdênio, os alemães conseguiram produzir canhões eficientes (o molibdênio derrete a 2260 graus centígrados). Assim, com Big-Berthas resistentes, conseguiram, em 1918, bombardear Paris a uma distância de 120 quilômetros.

O interessante dessa história é que o molibdênio utilizado pelos alemães era importado dos Estados Unidos, após a extração desse metal em minas existentes no estado do Colorado. Somente no final da guerra, os americanos “desconfiaram” de que o molibdênio era usado para fins bélicos e interditaram as minas. Intrigante, não é mesmo?

Pois é. Outra história interessante aconteceu na Segunda Guerra Mundial envolvendo outro metal – o tungstênio.
O tungstênio, também chamado de wolfrâmio, é um dos metais mais duros e só derrete a 3.400 graus centígrados. Mísseis de pequenas dimensões temperados com tungstênio podem destruir tanques de guerra.

Hitler, aconselhado pelos seus cientistas, resolveu estocar tungstênio. Depois de esgotar suas reservas, os alemães importavam esse metal de Portugal. O pagamento era feito em ouro, em geral roubado dos judeus. Ouro até de dentes de judeus mortos em câmara de gás. Conta-se que um grande banco de Lisboa amealhou 44 toneladas de ouro em barras carimbadas com a suástica nazista.

Salazar, o ditador português, emprestou aos Aliados uma base aérea nos Açores e vendia tungstênio aos alemães. Sabendo do desespero dos alemães por esse metal, aumentou o preço de 1100 dólares a tonelada, em 1940, para 20 mil dólares, em 1941.

Somente no dia 7 de junho de 1944 – o dia seguinte ao Dia D, Salazar, espertamente, decretou o embargo de tungstênio aos nazistas.

Dois outros metais também foram, recentemente e de forma indireta, responsáveis por devastadoras guerras na África Central. Trata-se do Tântalo e do Nióbio, que, sem saber, o leitor pode estar carregando pequena quantidade no bolso.

Esses nomes têm origem numa tragédia da mitologia grega. Nióbia, nome de origem do nióbio, ganhou a ira dos deuses por se vangloriar da beleza de suas sete filhas e Tântalo matou o próprio filho.
Esses metais, por serem densos, resistentes ao calor, não corrosivos e bons condutores de eletricidade são utilizados nos telefones celulares. São encontrados na superfície do solo, por exemplo, do Congo.

Os habitantes daquela região abandonaram a agricultura para cavar e exportar aquela terra aos europeus. Daí o surgimento de grandes acampamentos cercados por prostitutas escravizadas.

Com a escassez de alimentos, começaram a caçar gorilas, que praticamente foram extintos. Depois de alguns anos e milhões de celulares, os fabricantes perceberam que financiaram uma grande anarquia que se alastrou pela África Central produzindo guerras e milhões de mortos.

Em 2006, a União Europeia baniu a solda de chumbo em produtos de consumo. Muitos fabricantes optaram pelo estanho em substituição ao chumbo. Sabe onde o estanho é abundante? No Congo.

Da leitura do livro que contém essas histórias que resumi (“A colher que desaparece”, de Sam Kean), lembrei-me de que há muito tempo, na época de faculdade, li um livro muito interessante: “O metal do Diabo”, de Augusto Céspedes.

Nele, o autor boliviano conta sobre a tragédia humana que representou a exploração das minas de prata em seu país.

Parece que muitos metais são, além de bélicos, diabólicos!

 

 

Adalberto Nascimento

Ex-secretário de Edificações e Urbanismo (1983/88), de Transportes e presidente da Urbes (1993/96), é engenheiro civil graduado pela Poli-USP (1972), pós-graduado na área de Transportes, atua como engenheiro, consultor e professor universitário.
Associado n.º 1 da AEASMS e servidor municipal aposentado, é escritor, autor de livros de crônicas e curiosidades matemáticas e membro da Academia Sorocabana de Letras. Escreve quinzenalmente neste espaço

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