Coluna do Dal

Da Bíblia

No texto da Bíblia, curiosamente não aparece a palavra “bíblia”. Ela vem do grego e significa “livros”. E também “rolos”, uma vez que cada livro era escrito em um só rolo de papiro ou de pergaminho. O papiro era obtido de uma planta abundante no antigo Egito. Já o pergaminho resultava de uma adequada preparação de peles de animais (cabra, carneiro, cordeiro ou ovelha).

São João Crisóstomo (349-407), patriarca de Constantinopla, foi quem, no século IV d.C., primeiro utilizou a palavra “bíblia” para designar as Sagradas Escrituras. Desde então, esse termo passou a ser utilizado como sendo uma palavra no singular.

A Bíblia foi originalmente escrita quase totalmente em hebraico antigo. Algumas partes foram escritas em língua irmã do hebraico, o aramaico. Consta que Cristo também falava em dialeto aramaico de Nazaré, local onde provavelmente nasceu.

Nos anos 50, foi encontrado o único texto bíblico traduzido para o aramaico dialetal de Nazaré. Trata-se dos cinco primeiros livros da Bíblia, o Pentateuco.

Existem várias Bíblias: judaica, católica, protestante, ortodoxa etc. A mais antiga, composta de 24 livros, é a judaica, chamada pelos católicos de Antigo Testamento, termo não aceito pelos judeus. A Bíblia católica tem 73 livros, incluindo, além dos livros do Novo Testamento, sete livros que os judeus consideram apócrifos por serem obras destituídas de autoridade canônica, ou seja, em desacordo com as regras religiosas.

Para os judeus, os livros mais importantes são os cinco primeiros e que compõem a Torá ou Torah, a primeira Bíblia (o livro da Lei de Moisés), também chamada de Pentateuco e que compreende o Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuterônimo.

Na Bíblia hebraica o texto é escrito da direita para a esquerda, de forma corrida, sem nenhuma separação e contendo apenas consoantes, pois no antigo alfabeto hebraico não existiam vogais. Imaginem a enorme dificuldade que foi traduzi-la, primeiro para o grego e depois para o latim. Isso sem contar que as traduções eram feitas com base em cópias, muitas vezes cópias de cópias, uma vez que os originais nunca foram encontrados.

A ordem dos livros da Bíblia foi modificada quando foram feitas as traduções do hebraico e aramaico para o grego. Essa tradução foi realizada entre os séculos IV e II a.C. por setenta estudiosos judeus. Por isso ela é chamada de “Septuaginta”. Entretanto, a tradução – feita, segundo dizem, em apenas setenta e dois dias – não é literal, mas algo como uma interpretação.

Os primeiros cristãos, na verdade, faziam parte de uma seita judaica. A partir do século II d.C., o cristianismo afastou-se do judaísmo e tornou-se grego e romano, graças, sobretudo, aos esforços de Paulo de Tarso.

A despeito de ter sido usada e citada por Cristo, começaram a acrescentar na Bíblia judaica, além dos sete livros considerados apócrifos pelos judeus, os escritos do Novo Testamento: as Epístolas – sobretudo as de São Paulo –; os quatro Evangelhos (Mateus, Marcos, Lucas e João); os Atos dos Apóstolos e o Apocalipse, atribuído a São João.

Entre os anos 387 e 405 d.C., São Jerônimo iniciou a tradução da Bíblia para o latim e a denominou de Vulgata. Essa tradução foi posteriormente completada por outros autores. Vulgata significando “para o vulgo”, ou seja, “para o povão”. Essa versão foi o primeiro livro impresso pelo maquinário inventado por Gutenberg, em 1452, e foi considerada a versão oficial pela Igreja Romana em 8 de abril de 1546, durante o Concílio de Trento.

A partir dessa data, tiveram início as divergências entre a Igreja latina e a oriental. A latina optando pela Vulgata e a oriental (ortodoxa) optando pela versão grega, ambas alegando que suas traduções tinham sido “inspiradas” por Deus.
É interessante saber que antigamente não existia a classificação temática da Bíblia. Em 1231, apareceu em Paris a primeira Bíblia dividida em capítulos, e somente em 1553 o impressor francês Robert Estiénne (1503-1559) publicou toda a Bíblia em versículos.

Como vimos, este relato induz a considerarmos a história da Bíblia uma espécie de história de Torre de Babel. Isso sem levarmos em conta as demais Bíblias – do protestantismo e de outras seitas cristãs.

Todavia, independentemente da versão, a Bíblia não deixa de ser um livro monumental. É o único livro declarado Patrimônio da Humanidade e, conforme o escritor espanhol Juan Arias, “um monumento literário-religioso com uma tradição histórica nunca superada por nenhuma outra publicação em escala mundial”.
Pena que, interpretada de forma esdrúxula, tenha servido para enriquecer pilantras que, de forma inescrupulosa, usam-na para vender ilusões e paraísos a pessoas fragilizadas, em geral gente simples de boa-fé.

 

Adalberto Nascimento

Ex-secretário de Edificações e Urbanismo (1983/88), de Transportes e presidente da Urbes (1993/96), é engenheiro civil graduado pela Poli-USP (1972), pós-graduado na área de Transportes, atua como engenheiro, consultor e professor universitário nas áreas de Sistema Viário, Trânsito, Transportes, Planejamento Urbano, Informações Geográficas e Geoprocessamento.

Associado n.º 1 da AEASMS e servidor municipal aposentado, é escritor, autor de livros de crônicas e curiosidades matemáticas e membro da Academia Sorocabana de Letras. Escreve quinzenalmente neste espaço

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