Coluna do Dal

Das guerras do ópio

Desde a antiguidade, o ópio era usado como erva medicinal. No século XIX, artistas, escritores e poetas usavam ópio para, – conforme acreditavam –, atingir um estado mental onírico e aumentar a criatividade.

O uso dessa droga era tão difundido que existiam preparados de ópio até para recém-nascidos. Uma solução de ópio com álcool, chamada láudano, era recomendada para mulheres e vendida em farmácias sem necessidade de receitas.

O ópio é extraído da papoula, hoje largamente cultivada em regiões de Burma, Laos e Tailândia, países do sudoeste asiático. Contém 24 alcalóides, sendo a morfina o mais abundante deles. Esse alcalóide foi isolado da papoula pelo alemão Friedrich Serturner e foi por ele batizado em alusão a Morfeu, o deus grego dos sonhos.

Em 1898, químicos da Bayer alemã submeteram a morfina ao mesmo tipo de reação que transformou o ácido salicílico em aspirina. Obtiveram assim a diacetilmorfina, um narcótico bem mais poderoso que a morfina e que recebeu a designação de heroína, na suposição dos efeitos heroicos que essa droga produziria, sem os inconvenientes da morfina.

Sucede que a molécula da heroína viaja mais rapidamente do que a morfina pela corrente sanguínea e produz euforia intensa e quase instantânea à sua absorção, sendo, por isso, altamente viciante.

Na China, o ópio foi consumido como remédio durante centenas de anos. Todavia, essa função medicinal tomou um caráter secundário com o surgimento do tabaco. Fumar era um hábito desconhecido do Velho Mundo, até quando Cristóvão Colombo trouxe o tabaco do Novo Mundo.

Todavia, por ser coisa de gente primitiva, fumar acabou sendo proibido em vários países, com penas severas aos infratores. Como exemplo, as punições na Rússia compreendiam incisão nos lábios, açoitamento, castração e exílio.

Mesmo assim, o hábito disseminou-se e até havia incentivadores ao cultivo e consumo do tabaco, como o embaixador da França em Portugal, Jean Nicot, que foi homenageado com a designação botânica da planta e do alcalóide.

Da “Wikipédia”, temos que alcaloide é uma substância de caráter básico derivada principalmente de plantas, podendo ser também derivada de fungos, bactérias e até mesmo de animais e cuja fórmula é basicamente composta de nitrogênio, oxigênio, hidrogênio e carbono.

Na China, a proibição do consumo do tabaco redundou numa dissimulação deletéria: o péssimo hábito de se fumar ópio misturado com tabaco, conforme receita ensinada pelos portugueses estabelecidos em entrepostos comerciais daquele país.

Outro alcaloide, menos deletério, entra nesta história: a cafeína, encontrada no chá, que era largamente produzido pelos chineses e do qual os ingleses eram consumidores contumazes.

A Grã-Bretanha viu uma forma malévola de comercializar chá com a China. Sabedores de que os chineses eram viciados em ópio, começaram a cultivar papoula em Bengala e em outras partes da Índia dominadas pelos ingleses.

A partir dessa artimanha, começaram a entupir a China com ópio. Em 1839, o governo chinês, preocupado com aquela farra, confiscou e destruiu um estoque equivalente a um ano de consumo.

Escaramuças entre chineses e marinheiros ingleses, em Cantão, serviram de pretexto para a Inglaterra declarar guerra à China. A Inglaterra derrotou a China na que ficou conhecida como a Primeira Guerra do Ópio (1839-1842).

Além de receber enorme indenização, a Inglaterra exigiu a abertura de cinco portos ao comércio britânico e a cessão de Hong Kong, que virou colônia britânica.

Quase 20 anos depois, tivemos a Segunda Guerra do Ópio, após a qual os britânicos e franceses abocanharam mais concessões dos chineses. Mais portos foram abertos, europeus obtiveram a permissão de residir no país, o comércio do ópio foi legalizado e os missionários passaram a ter liberdade de locomoção e de pregação religiosa.

Tudo isso deu no que deu. A China entrou num período caótico de revoluções que culminaram com a Revolução Chinesa de 1949 – a revolução popular que possibilitou a ascensão do líder Mao TséTung.

Hoje, parece que a China está dando o troco ao mundo ocidental. Além de praticamente ditar o funcionamento econômico mundial, está comprando extensas áreas de terras cultiváveis na África (Tanzânia) e na América do Sul (Brasil). Um pequeno parêntese: dizem que a união do Brasil com a Tanzânia, em termos comerciais, faria desses dois países o celeiro do mundo.

Enfim, como foi visto, podemos considerar que muita desgraça ocorreu envolvendo ópio, nicotina e cafeína. Por estas bandas, temos outros ingredientes perversos: maconha, cocaína, crack etc. Será um prenúncio de guerras heroínas?

 

Adalberto Nascimento

Associado n.º 1 da AEASMS, servidor municipal aposentado, ex-secretário de Edificações e Urbanismo (1983/88), de Transportes e presidente da Urbes (1993/96).

Engenheiro civil graduado pela Poli-USP (1972), é pós-graduado na área de Transportes, atua como engenheiro, consultor e professor universitário.

É escritor, autor de livros de crônicas e curiosidades matemáticas e membro da Academia Sorocabana de Letras. Escreve quinzenalmente neste espaço.

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