“Determinar as características do terreno, área de conhecimento dos engenheiros geotécnicos, é fundamental em obras que impliquem movimentação de terra”, afirma presidente da entidade
Apesar de ser peça importante em qualquer obra, o projeto geotécnico é muitas vezes negligenciado por empresas. Em entrevista ao Portal AECweb, o presidente da Associação Brasileira das Empresas de Projeto e Consultoria em Engenharia Geotécnica (ABEG), engenheiro Ilan Davidson Gotlieb, fala sobre como a construção civil enxerga a atuação do engenheiro geotécnico, as inovações do setor e a participação da associação na atualização de importantes normas técnicas.
Em linhas gerais, como o projeto geotécnico garante a segurança de uma obra?
Esses projetos tratam da interação entre o solo e as estruturas. Determinar as características do terreno, área de conhecimento dos engenheiros geotécnicos, é fundamental em obras que impliquem movimentação de terra – por exemplo, o apoio de estruturas no solo ou a execução de contenções, como os arrimos. A segurança dessas atividades está intimamente ligada à existência de bons projetos geotécnicos, elaborados por profissionais especializados.
As empresas entendem a importância de contar com projetos geotécnicos em suas obras?
Infelizmente, essa compreensão ainda não está muito difundida. São comuns projetos de fundações e contenções elaborados por engenheiros civis sem especialização ou sem experiência em geotecnia. Nesses casos, geralmente, os contratantes entendem que a elaboração de projeto geotécnico é uma despesa que eleva o custo final da obra. São empresas que não têm a consciência de que o projeto geotécnico bem executado e preparado por profissional competente muitas vezes se paga, pois a economia gerada com a eliminação de retrabalhos e o aumento da segurança são infinitamente maiores.
Qual segmento melhor utiliza projetos geotécnicos: privado ou público?
Quem melhor utiliza os projetos são as empresas que conhecem sua importância e benefícios, independentemente do setor em que atuam. Para obras de grande porte, desde barragens a grandes empreendimentos imobiliários, quer sejam públicas ou privadas, é comum existirem projetos geotécnicos. Já em edificações de menor porte, a tendência é que os responsáveis deixem de lado a contratação do projeto.
Essa é uma realidade de todo o país?
É uma questão cultural. Na cidade de São Paulo, por exemplo, as construtoras estão cientes da importância da geotecnia e, consequentemente, não iniciam seus trabalhos enquanto o projeto não for elaborado. Por isso, há no município uma grande quantidade de empresas especializadas em projetos geotécnicos. Em outras regiões, o número de escritórios é bem menor e chega até a ser inexistente em várias capitais.
Recentemente, um trecho da ciclovia Tim Maia, no Rio de Janeiro, cedeu devido à erosão do solo causada por fortes chuvas que atingiram a cidade. Nesse caso, é possível dizer que houve falha no projeto geotécnico?
Em princípio não. Nosso entendimento é que foi um caso de insuficiência de drenagem. Porém, como não tivemos acesso à documentação da obra, não podemos afirmar com convicção. Mas as características do ocorrido e o fato de ter acontecido após intensa chuva são indicativos de que o sistema de drenagem não funcionou corretamente, encharcando o solo que veio a escorregar.
Tecnologicamente, estudos geológicos feitos no Brasil acompanham o nível de outros países do mundo?
Podemos dizer que sim. O Brasil dispõe de boas empresas de investigação geotécnica, que estão em constante atualização. Mas, obviamente, esbarram sempre no problema econômico. Em momentos de crise, os investimentos em equipamentos são reduzidos, especialmente, daqueles importados.
Qual a sua avaliação sobre a formação do engenheiro geotécnico no Brasil?
Hoje, estão disponíveis vários cursos de pós-graduação específicos em geotecnia, muitos deles com nível muito bom. Qualquer engenheiro que queira se especializar na área tem condições de obter conhecimento teórico através de mestrados e doutorados. Além disso, pode aprimorar sua formação com a experiência prática, atuando em empresas do setor, tanto de projeto quanto de execução.
As normas técnicas da geotécnica estão atualizadas?
Sim, as normas são constantemente atualizadas. Recentemente, tivemos a revisão da ABNT NBR 5629 — Execução de tirantes ancorados no terreno. A ABEG também participa da revisão da norma que regulamenta o projeto e a execução de fundações, a ABNT NBR 6122, integrando a Comissão de Estudos que vai elaborar a norma técnica para muros e taludes. A associação trabalha na atualização dos manuais de escopo para a contratação de projetos e serviços referentes à norma de desempenho ABNT NBR 15575.
Como o mercado recebeu o Prêmio ABEG Sigmundo Golombek, que reconhece os melhores projetos de fundações e contenções?
Ainda não temos o feedback, pois o evento aconteceu recentemente. Mas, em conversa com profissionais da construção civil que tinham conhecimento do prêmio, todos foram unânimes em enaltecer a iniciativa.
Houve boas surpresas entre os projetos inscritos?
Todos os projetos inscritos foram de excelente qualidade e, segundo a comissão julgadora, a escolha do vencedor foi bastante difícil. As soluções se destacaram pelo elevado nível técnico, o que demonstra a importância de se ter projetos geotécnicos elaborados por empresas especializadas.
Fonte: AECweb
Foto: infraestrutura.eng.br